sexta-feira, 3 de abril de 2020

Trabalhadores de Santa Quitéria acusam sindicato de peleguismo e omissão durante demissão em massa na Democrata

Após 25 anos de atividades ininterruptas, a fábrica de calçados Democrata de Santa Quitéria, Ceará, anunciou na manhã de ontem, quarta-feira (01/04), a paralisação das atividades por tempo indeterminado e s demissão em massa de 1.143 trabalhadores, devido a paralisação da economia por conta da pandemia da covid19/coronavírus. A medida drástica alcançou também para a filial da Democrata na cidade de Camocim, Ceará.
 
Permanecerão apenas cerca de 25 trabalhadores, gestantes, sindicalistas e a equipe de Segurança do Trabalho. Os demais receberão os direitos trabalhistas e ficarão em suas casas esperando ou novos empregos ou a retomada econômica. Maior empregadora de Santa Quitéria, a empresa paulista empregava 1.168 funcionários na cidade.
 
O diretor industrial da fábrica, Samuel Pimenta, que teria “chorado” dentro do parque industrial, estima retorno dentro de três ou quatro meses, quando voltará a contratar os funcionários agora dispensados de maneira gradativa.
 
A fábrica possui muito estoque e não pretende fechar. O diretor da Democrata pediu a todos que obedeçam as autoridades sanitárias e fiquem em casa. Também pediu união e oração para a empresa voltar ainda mais forte. Antes de tomar a decisão drástica, a Democrata havia decretado férias coletivas. 
 
Empresários, comerciantes e autoridades do município estão preocupados com o cenário de incerteza, isto porque a Democrata injetava só com o pagamento de salários cerca de R$ 1,5 milhão por mês na economia local.
 
Pelego — Poupado da demissão, devido a estabilidade sindical, o diretor do sindicato calçadista local Clertiano da Silva foi acusado de peleguismo pelos trabalhadores demitidos. 
 
“A demissão em massa só poderia ser considerada legal com a participação do sindicato dos Calçadistas na negociação, que deveria ser aprovada em assembléia que não aconteceu e poderia ser feita até pelo whatsapp. Clertiano, todos sabem, antes de ser diretor do sindicato, foi durante quatro anos supervisor da fábrica. Clertiano foi pelego”, disse (em off) um dos demitidos. “A gente foi demitido sem luta, sem negociação e sem assembleia. O sindicato foi omisso e Clertiano ainda tentou jogar a culpa no prefeito”, completou. 
 
De fato, não houve qualquer comunicação sobre a negociação coletiva para a demissão em massa. Nenhum dos demitidos recebeu cópia do acordo coletivo. “É evidente que faltou prontidão e assistência do sindicato aos trabalhadores. Clertiano aceitou tudo calado, não lutou pela manutenção dos empregos, porque não foi demitido”, disse (em off) outra trabalhadora demitida.
 
Clertiano da Silva, que foi supervisor da fábrica antes de tornar-se diretor sindical, tenta negar a acusação de peleguismo, afirmando que foram propostas pelo menos duas alternativas à empresa para evitar a demissão em massa. 
 
“Uma delas era determinar férias coletivas de dois meses, com pagamento de salário e pagamento parcelado em até 15 vezes das férias. A outra era a redução da carga horária com redução salarial. No entanto, a empresa não acatou as propostas”, disse ao jornal Díário do Nordeste o sindicalista. 
 
Sem citar a Medida Provisória N° 936/2020 — que trata da decisão do Governo Federal de arcar com até dois meses do salário dos empregados, para impedir demissões em massa —, a passividade do sindicalista Clertiano causou estranheza. “Clertiano parece concordar com a decisão da empresa”, disse (em off) outro demitido. 
 
De fato, ao jornal Diário do Nordeste, Clertiano fez declarações muito semelhantes ao advogado da Democrata, Adenauer Moreira. “Segundo o diretor sindical Clertiano da Silva, a fábrica investiu recentemente cerca de R$ 1 milhão em máquinas, que estão paradas. Por isso, ele acredita que haverá recontratação do quadro de funcionários dispensado tão logo o cenário econômico do País melhore, com o fim da crise na saúde. A empresa de calçados é um importante motor para a economia da região, empregando não só a população local, mas de municípios vizinhos, como Santa Quitéria, Catunda, Hidrolândia e Varjota, lembrou o diretor sindical.”
 
Prefeito aciona rede de proteção social  — O prefeito de Santa Quitéria Tomás Figueiredo acompanhou passo a passo o diretor da Democrata. E de imediato convocou a empresa a reforçar a rede de proteção municipal com medidas mitigadoras para manter a economia local sem sobressaltos, orientado pela portaria do Governo Federal. 
 
Em longa carta aberta endereçada a cidade, disse Tomas Figueiredo: “Com muita alegria presenciei e participei da inauguração do primeiro galpão da fábrica de calçados de Santa Quitéria em 1996. Respirava a satisfação maior na grande conquista, junto com minha mulher Cândida Figueiredo, então deputada estadual. Estávamos gerando muitos empregos e renda para os Quiterienses, espantando o terrível e ameaçador êxodo rural e urbano. Todo o comércio aplaudiu, principalmente, os mercantis que passaram a vender para os empregados com desconto na folha, através da cooperativa, tal era a relação de confiança e credibilidade. O comércio de nossa cidade melhorou, avançou, mudou pra melhor. Os mercantis deram um grande salto, cresceram, diversificaram. O comércio ganhou novas lojas e produtos como bicicletas e motos dispararam na comercialização. O recrudescimento dos empregos e estruturas, proporcionou uma qualidade de vida melhor para os Quiteriense”. 
 
Tomás Figueiredo chamou o virus de “inimigo maldoso e invisível que muda todo o quadro e tornou a vida de bilhões de pessoas um verdadeiro pesadelo”.
 
Solidário aos demitidos, discordando da decisão da Democrata, mas confiante na breve retomada da produção, Tomás acrescentou: “É muito difícil e contraditório afirmar que a Direção da fábrica agiu com coerência em encerrar suas atividades”. 
 
Parceiro histórico da Democrata, Tomás Figueiredo ainda relembrou sua luta junto ao BNB em busca de financiamentos para a fábrica manter empregados e vencer o pessimismo de executivos que não enxergavam que a economia brasileira sempre venceu crises, produzindo e não parando. 
 
Para o prefeito a Democrata não fugiu como já fizeram outros no Ceará. E a empresa dispõe no seu ativo de recursos para honrar com todos compromissos e direitos dos trabalhadores demitidos, assegurando a permanência daqueles respaldados por lei. 
 
Durante a demissão, foi dada a palavra ao prefeito que a fábrica reiniciará suas atividades logo que as certezas sobre o virus sejam maiores que as incertezas.

via: Ceará em Off.

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